UX/UI Designer
10 min.
Figma + Miro
Crowdfeeding
Eu realmente acredito que a tecnologia deve resolver problemas reais no mundo real, então eu tinha em mente que construiria algo com propósito.
Crowdfeeding é o nome que dei para um aplicativo. Esse produto nasceu a partir de um projeto sugerido pela Ironhack, bootcamp onde realizei meu curso de UX/UI design. Na época, tive a oportunidade de escolher um assunto que realmente me interessava e um prazo de 5 semanas para construí-lo usando minha visão e processos de design aprendidos durante o programa para entregar um produto digital e apresentá-lo em 10 minutos.
Eu estava extremamente pensativo sobre o tema que escolheria, e foi quando eu estava indo almoçar que parei para ouvir as notícias:
“A fome aumentou no Brasil em 2022 e atinge 33,1 milhões de pessoas”
Naquele momento fui invadido por tristeza e indignação. Então, motivado por esses sentimentos, instantaneamente eu soube o que gostaria de consertar.
Era hora de fazer a pesquisa de mesa para descobrir como eu poderia ajudar.
Pesquisa de mesa
Assistindo TV ou navegando na internet para encontrar informações sobre o tema não foi tão difícil, principalmente quando o problema ocorre pela segunda vez em pelo menos 5 anos.
O país enfrenta um aumento da fome desde 2018, quando registrou seu retorno ao Mapa da Fome. Com a pesquisa, percebi que a fome no meu país é um problema antigo definido pelo termo: insegurança alimentar.
Mas o que é isso?
De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, sigla traduzida para português) e o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística):
Além desta definição, existem níveis de insegurança alimentar:
E o que causou esse aumento?
O desmonte de políticas públicas, a piora do cenário econômico, as diferenças sociais e o segundo ano da pandemia de Covid-19 foram as principais causas que garantiram esse ambiente de alerta.
Segundo Nilson Maciel, professor (UFPR) e pesquisador:
“Podemos dizer também que a fome tem endereço, cor e identidade social”
Cruzando esta frase com os dados coletados podemos observar que:
33,1 milhões de pessoas passam fome;
O Norte e nordeste do Brasil são as regiões mais afetadas;
A fome no Brasil voltou ao nível dos anos 1990;
Mulheres e pessoas negras são as que mais sofrem.
Para identificar mais stakeholders, voltemos aos níveis de insegurança alimentar.
Visualizando essa estrutura, é possível definir grupos de agentes que são responsáveis ou que poderiam tentar minimizar o problema, sendo:
Essa perspectiva mostra que, no fundo, o Governo pode trabalhar com um pragmatismo mais estrutural abrangendo toda a nuance, uma vez que se observou na pesquisa que essa instituição tem o poder de reduzir os impactos por meio de políticas sociais.
Ao mesmo tempo, as organizações não governamentais normalmente atendem mais rápido a demanda urgente por conseguirem penetrar mais longe e chegar mais rápido que os governos a lugares em crise. Em 1994, Enrique Albizu, Presidente da Medicus Mundi — Espanha, já dizia:
“Os governos esperam que a situação seja completamente catastrófica antes de agir, e então se deparam com muitas dificuldades, que podemos resolver mais facilmente porque trabalhamos silenciosamente nos países afetados há muito tempo”
Priorizando os mais impactados nesta história, situados na insegurança alimentar de alto nível (a sociedade pobre), decidi olhar quais são os desafios das ONGs em fazer esse trabalho árduo.
O desafio das ONGs
Os desafios foram potencializados pela pandemia. O maior deles para as ONGs é arrecadar fundos para comprar itens para compor as doações, principalmente nos dias de hoje onde o número de desamparados cresceu e as pessoas deixaram de doar por causa dos impactos econômicos.
Pesquisa quantitativa
Após definir um objetivo de pesquisa que era descobrir como esse produto poderia gerar outra alternativa para estimular as pessoas a doarem dentro de suas realidades, consegui que quase 50 (49, para ser mais específico) pessoas respondessem minhas perguntas. A maior parte era de São Paulo, com 65% de mulheres e pessoas entre 18 e 35 anos.
Resultados:
Meu foco com essa etapa de empatia foi tentar identificar como as pessoas estavam conectadas às atividades de doações. Nos dois primeiros pilares foi possível identificar um cenário propício para seguimento do projeto e o pilar de motivações seria uma parte importante onde eu deveria investigar mais.
Entrevista Qualitativa
Me concentrei em como este produto poderia fornecer segurança para a alocação das verbas (porque esse era um dos motivos que levava as pessoas a doar alimentos em vez de dinheiro) e ser acessível em termos financeiros.
O alimento é realmente o que será entregue no final, mas pensando estrategicamente, as organizações podem fazer mais com mais espaço para trabalhar quando munidas de orçamento, podendo até mesmo alcançar mais pessoas necessitadas.
Decidi investigar nas entrevistas qual era a percepção das pessoas na doação de alimentos ao invés de dinheiro e percebi que as pessoas, na verdade, não estavam evitando doações em dinheiro, apenas tinham algumas necessidades durante essa ação.
As pessoas compartilharam comigo tópicos como:
Segurança
“[…] Na rua me sinto encurralado em doar, a segurança é um ponto importante”
Doações acessíveis
“[…] Posso doar pequenas quantias. Quando algo é urgente eu sempre ajudo”
Confiabilidade
“[…] Priorizar doações para alguma outra ONG que eu conheço, um amigo que trabalha lá”
Todos esses temas estavam ligados à própria ação de doar, mas descobri algo por trás disso. Diferia, mas, simultaneamente, tinha um ponto de interseção:
ONG:
“[…] Outro ponto é tocar as pessoas de alguma forma. Ninguém doa por doar, as pessoas tendem a doar para causas com as quais se identificam ou se sentem tocadas por essa dificuldade”
Pessoa entrevistada:
“[…] Se ficar nublado, se você apenas disser o que faz, mas não ver nada na prática, pode ser desmotivador”
Após o processamento desses direcionamentos, entendi que também deveria destacar a finalidade e materializar a destinação da doação.
Era hora de começar a etapa de definição.
Declaração do problema
ONGs precisam de uma nova alternativa para pessoas doarem, pois o número de desamparados cresceu e as pessoas pararam de doar devido aos impactos econômicos, problemas com segurança e comodidade.
Declaração de hipótese
Acredito que se disponibilizarmos uma plataforma que facilite a doação, reflita o impacto social na prática e que seja acessível, conseguiremos aumentar o número de campanhas de combate à fome. Saberemos que estamos certos quando as instituições conseguirem atingir suas metas de financiamento o suficiente para realizar essas ações.
How might we?
Executei o ‘how might we’, que é um exercício que consiste em criar uma estrutura orientada a uma simples questão:
Como podemos resolver um problema?
Persona
Seguindo, fiz duas personas, tanto para ONGs quanto para doadores. Também fiz um benchmark utilizando todo o material coletado para gerar soluções que pudessem atender as demandas.
Benchmarking
Neste momento, eu estava tentando entender como os outros players estavam atuando no mercado. Realizei uma espécie de meia análise SWOT usando a parte Strenght and Weaknesses do modelo para ver os pontos positivos e onde poderiam melhorar para gerar insights para minha solução. Também verifiquei o tamanho e quais são os produtos oferecidos.
De forma geral, as soluções atendiam o público em geral.
Decidi construir uma solução para organizações que lidavam especificamente com insegurança alimentar de alto nível, organizações que lutavam para distribuir alimentos para pessoas que não tinham o que comer, conforme já definido na etapa de pesquisa de mesa.
Essa decisão pode afunilar tanto o público quanto o processo decisório para o usuário final, e, como resultado, diferenciar o produto dos demais.
Mind mapping e Brainstorming
Essa decisão pode afunilar tanto o público quanto o processo decisório para o usuário final, e, como resultado, diferenciar o produto dos demais.
Estimulando o processo criativo e organizando o desenvolvimento de novas ideias, Ana Laura Albornoz, Shalom Seguins e Fabiano Arouche me acompanharam durante o Brainstorming (obrigado, pessoal, o apoio de vocês foi muito importante nessa jornada).
Método MoSCoW
Para complementar a ideação, utilizei uma técnica de priorização para entender o que tinha que ter (must have), deveria (should have), poderia (could have) e o que não teria (will not have), chamado método MoSCoW.
Jornada do usuário
Também fiz a jornada do usuário, uma representação gráfica das etapas que envolvem o relacionamento do cliente com o produto, reforçando os valores descobertos durante a empatia: um método onde as pessoas pudessem doar dinheiro, destacando o propósito e materializando o destino da doação.
Branding
Moodboard
No Moodboard, me concentrei em princípios descobertos durante a pesquisa. As pessoas tinham a necessidade de se sentir seguras, então nada melhor do que usar uma cor que transmitisse consistência e confiabilidade.
Para destacar os “call to actions” (estímulos que levam os usuários a realizar ações, normalmente botões) e mostrar ao usuário que o que ele estava fazendo era algo valioso, pensei no amarelo, a “cor dourada”, que pode naturalmente chamar a atenção e refletir otimismo por ser uma cor alegre e acolhedora.
Naming
Conforme explicado no benchmarking, orientado por essa necessidade de diferenciação, eu queria mostrar exatamente o que atacaríamos já pelo nome.
Muitas pessoas me questionaram o porquê de não optar por um nome em português.
Eu tinha a visão de que o conceito do projeto poderia se expandir para fora das fronteiras brasileiras. Cozinhas solidárias não são iniciativas exclusivas do Brasil.
Foi por este motivo que decidi pesquisar um pouco mais sobre a palavra Crowdfunding no Google Trends conforme demonstrado na imagem acima. Meu objetivo era entender a popularidade do termo.
Como podemos observar, o interesse pela palavra manteve uma média nos últimos 10 anos, atingindo um pico em 2016 aqui no território nacional.
Crowdfunding é a palavra que define a captação de recursos para iniciativas de interesse coletivo por meio da agregação de múltiplas fontes de financiamento. Foi pensando nessa relação que resolvi chamar a solução de Crowdfeeding. Uma palavra que, se quebrada, traduz a essência de toda essa iniciativa:
Alimentar multidões.
A solução
Como mostrado no processo de descoberta, tive que trabalhar com a perspectiva de pessoas que precisavam se sentir seguras em algumas variáveis, tinham preferências em doar alimentos ao invés de dinheiro em casos específicos e o valor das doações também deveria ser acessível.
Foi com base nesses princípios que idealizei uma plataforma que pudesse simular uma montagem de cestas de alimentos virtuais com itens escolhidos pelas instituições.
É como fazer compras no supermercado, mas, para outra pessoa.
Os usuários podem optar por doar cestas básicas completas de alimentos ou produtos individuais, o que torna mais acessível.
Criei um feed que mostra grupos de causas uma vez que as pessoas demonstraram que a chance de doar para causas que elas estavam mais ligadas aumentaria. Esse tipo de filtro calibraria o algoritmo e entregaria apenas o que interessasse ao usuário.
Também é disponibilizada uma barra de busca caso o usuário conheça alguma ONG. Conforme compartilhado na entrevista, as pessoas se sentem mais à vontade para doar para uma instituição onde conhecem alguém que trabalhe lá.
O que fiz foi tentar dar comodidade, segurança, confiabilidade e agilidade durante o processo de doação de dinheiro, destacando a finalidade e materializando o destino da doação.
Essas e outras funcionalidades você pode conferir a seguir:
Próximos passos
Antes de implementar qualquer outro recurso, é essencial testar com um número maior de usuários. Como é um marketplace, tive que expor a plataforma tanto para o público “compradores” quanto para “vendedores”.
Então, basicamente:
Testar;
Validar ou Invalidar;
Testar novamente.
Aprendizados
Roadmap
Mesmo antes de o prazo do projeto ter começado, eu já tinha meu problema para entender mais profundamente. Para começar, algo crucial deveria ser definido, e esse foi o roadmap.
O Design Thinking foi meu guia, então esse modelo de roteiro me permitiu visualizar essa estrutura através de uma projeção de tempo.
Esta simples visualização organizada me ajudou de algumas maneiras importantes: Controlar minha ansiedade e dividir grandes tarefas em pedaços para por tudo junto depois.
Comunidade
No passado, quando eu era mais ingênuo, eu achava que compartilhar projetos e ideias de negócios poderia ser o começo de um assalto de criatividade.
Como designer iniciante, acabei entendendo que isso é besteira. Que tipo de comunidade queremos construir? Este é um processo que leva tempo.
A comunidade que tive a oportunidade de conhecer agora é composta de pessoas abertas, ouvintes e dispostas. Este projeto não seria feito sem parceiros dando pitacos aqui e ali.
Então, meu conselho, estamos vivendo na era da informação, apenas compartilhe!